Quarentena em casa: a dura tarefa de cuidar, educar e se relacionar com nosso filhos em tempo integral
Isolamento social faz pais assumirem papeis que talvez não estejam tão preparados
Em março de 2020, quando a maior parte dos governos decidiu implantar quarentenas e outras restrições para conter a COVID-19, a proposta era: além de se proteger contra a doença, vamos aproveitar esse tempo para curtir a família, conversar, jogar, ler, cozinhar, tudo isso bem juntinho um do outro.
Uma semana, tudo ótimo. Duas semanas, hum, já não temos tanta coisas para fazer dentro de casa… Três semanas, a situação começou a complicar graças à tarefa de dar aula, trabalhar, limpar, cozinhar, brincar. Após três meses trancados em casa, a vida começa a voltar ao normal na Inglaterra, mas estamos longe ainda de retomar coisas que gostaríamos de fazer.
Um dia desses nossa filha mais nova nos olhou e com uma carinha aflita soltou: “não quero que vocês fiquem chateados, mas é que eu não aguento mais ver vocês toda hora”. É possível criticar a criatura por causa desse comentário? Claro que não. Ela expressou claramente o que está engasgado em muitos de nós e não temos coragem de dizer.
Isso significa que não nos amamos, não nos aturamos mais? Sem dúvida, não. Saímos de um cotidiano extremamente corrido e estressante para um dia a dia de mesmice e tédio, além de precisarmos nos adequar a tarefas que muitas vezes não sabemos nem por onde começar, como por exemplo, dar aula aos nossos filhos.
Brincando de ser professora
Tanto no Reino Unido como no Brasil, algumas escolas continuam transmitindo as aulas on-line, mas apenas uma pequena parcela tem mantido essa rotina. Na maior parte dos casos, como no de nossas filhas, as escolas colocam as matérias no site e deixam a tarefa de ensinar a cargo dos responsáveis e isso não tem sido saudável para o relacionamento entre pais e filhos. Além da falta de conhecimento do magistério, que muitos dos pais não possuem, mesmo se tenho algum conhecimento do assunto não significa que consigo ensinar de uma forma interessante e eficiente. Tem sido difícil aqui em casa porque as meninas nos veem como pais e não professores, profissionais ou animadores de festa infantil. Na cabeça delas, o lar não pode ser a mesma coisa que a escola, onde sentem o dever de estudar.
Atividade comum em alguns países da Europa e nos Estados Unidos, o homeschooling ou estudar em casa (os pais possuem autorização do governo para dar aulas em casa aos filhos ou pagam tutores para o ensino particular) não é uma tarefa simples. Uma coisa é acompanhar o desenvolvimento de seu filho na escola, ajudá-lo nas tarefas em casa e em alguns projetos, além de apoiá-lo no início da caminhada rumo à independência, outra é ter que fazer o papel de um profissional de uma carreira que não escolhi muitas vezes por falta de habilidade.
O resultado é preocupante. Para nós, assim como algumas pessoas que conhecemos no Brasil e na Inglaterra, os meses de quarentena têm sido catastróficos para o ensino de nossos filhos e, pelo que dizem pesquisas, é o retrato da maior parte das famílias.
Por outro lado, reaprender a desacelerar, a cuidar da casa e da família (para ambos, homens e mulheres), ter tempo para cozinhar com carinho, sem a pressa de ter que sair correndo para os vários compromissos do dia-a-dia, ensinar as crianças a importância de ajudar nas tarefas de casa e o exercício de viver em paz sozinho ou com a família, tem sido uma experiência gratificante que não esperávamos passar tão cedo.
O desafio, ao meu ver, é conseguir impor limites, ver claramente os deveres e direitos de cada um dentro de sua própria casa. Não é porque estamos em casa que vai ser possível comer doces todos os dias ou fazer de conta o fim de semana dura sete dias e poder ir dormir bem tardão e acordar mais tarde ainda. Para a saúde mental e física, alguma rotina é necessária também.
Minha maior dificuldade tem sido lembrar que eu tenho o direito e a necessidade de passar um tempo somente comigo, sair para uma caminhada sozinha, ter um momento de ler, escrever, estudar um pouco ou simplesmente não fazer nada. Mas, como toda boa e velha mãe, o instinto de cuidar não da folga, o sentimento de culpa por não estar o tempo todo dando atenção para as meninas é constante e o mal estar quando me forço a desligar um pouco é grande e é aí que toda a tensão e discussão começam.
A pandemia tem nos feito refletir sobre assuntos desagradáveis como doença, morte e uma visão mais pessimista de futuro, mas esses meses em isolamento também têm nos ensinado e viver de forma completamente diferente, a tentarmos ser mais calmos e pacientes e a lembrarmos que somos humanos e não máquinas programadas para consumir. Talvez a lição de tudo isso seja passar a viver com leveza e dedicação aos que amamos e a nós mesmos.
Realmente são tempos difíceis e que a pressão no trabalho tem aumentado significativamente e junto com isso uma insegurança tremenda de como será o 2° semestre? Como será 2021?
Quais as consequências que este período de isolamento deixará em nos, nos nossos filhos, famílias, economia?