Neuras de mãe
Apesar de ter sido filha única por quase sete anos, desde cedo fui criada brincando no chão, na grama, no barro. Me lembro de sair para pescar “peixinhos” com meus vizinhos e só depois de grande saber que o que eu “pescava” nas pequenas lagoas próximas de minha casa eram girinos!
E assim foi: pé no chão, tomar banho à noite, lavar a cabeça e ir para fora de casa continuar brincando, sem medo de pegar um resfriado. Lavava sempre as mãos antes das refeições que eram feitas em casa. Mas e quando o lanche ia para a rua? Do jeito que as mãos estavam o lanche ia para a barriga – afinal de contas, não contávamos com lenços umedecidos e álcool em gel para higienizar as mãos. E as frutas tiradas direto do pé, quem nunca experimentou?
Hoje em dia vemos nossos filhos trancafiados num apartamento, sem acesso a mato, a terra. A pouca areia que conhecem são as coloridas e bem tratadas da escola, quando lá têm (eu brincava na areia da construção da casa do vizinho). Nosso cotidiano foi invadido por teorias conspiratórias que exigem sabonetes antibacterianos, meias nos pés, secar os cabelos depois do banho.
Até onde chega a nossa neura? Não acho que minhas filhas devam andar no carro sem cinto de segurança ou ir à busca de girinos pelas poças de água por aí. Mas esse excesso de zelo é mesmo necessário? E a tal vitamina “S”, da sujeira? Devo confessar que sou sim a favor dessa deliciosa e divertida vitamina (risos).
Ano passado tivemos a oportunidade de passear numa cidade no exterior. Uma certa manhã, estávamos dentro do trem, em pé com nossas duas pequenas querendo explorar tudo com os olhos, pés, mãos, e um casal um pouco mais velho que observava as duas figurinhas tirou duas maçãs de dentro de uma sacola e as entregou diretamente a cada uma das meninas. Na hora só me veio à cabeça: “as maças estão sujas, minhas filhas segurando nas barras do trem”. Quando me dei conta as duas estavam devorando suas frutas sem pestanejar.
Nossa viagem acabou por termos que correr ao hospital? Não! Simplesmente curtiram o momento tão simples. A gentileza de pessoas que as olharam com simpatia, a comilança de uma simples maçã no trem, sem preocupações.
Os lenços umedecidos e o álcool em gel continuarão em minha bolsa (talvez por puro desencargo de consciência), mas quero ver milhas filhas sempre que possível com as mãozinhas, bocas e roupas manchadas por comerem amoras do pé e com os pés no chão. Sem neuras.
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